São noites perdidas, fins-de-semana, datas especiais. Horas e horas de trabalho. Picadas nos dedos. Queixas dos actores. Desespero. Tanto que muitas vezes pensou em desistir, mas a perseverança fê-lo continuar e viver da arte de chapeleiro e aderecista. Afinal, não há amor como o primeiro. Quem o diz é Luís Stoffel, 57 anos, natural de Santarém, olhando com orgulho para os seus trabalhos feitos à base de penas e tecidos e que mais fazem lembrar os adereços que os sambistas usam no Carnaval.
“São os meus meninos de ouro”, diz, durante a exposição “Chapéus Há Muitos”, que decorreu no âmbito do Festival Internacional de Teatro e Artes para a Infância e Juventude, no centro comercial W Shopping, em Santarém.
As raízes de Luís Stoffel são ribatejanas mas entretanto já viveu em Lisboa e reside actualmente em Portimão. De sorriso no rosto, Luís vai recordando os momentos em que brincava com os berlindes pelas ruas de Santarém e da paixão pela dança que sempre teve, tendo pertencido ao Grupo Infantil e Académico de Danças Ribatejanas durante vinte anos.
Solteiro e sem filhos, Luís Stoffel confessa que Santarém é uma cidade com potencial a nível cultural e tem jovens com talento no mundo das artes. O que falta agora, acredita, é que as autarquias apoiem mais as associações culturais e que dêem mais oportunidades a quem quer vingar no teatro, na pintura ou mesmo na dança
Conhecido na terra natal como ‘Luizinho’, foi na dança jazz que o artista entrou no mercado de trabalho, após ter frequentado a Companhia de Dança de Lisboa e a Universidade Marly-le-Roi (França), durante um ano.
Começou a dar aulas de dança jazz numa escola em Portimão e, mais tarde, criou a sua própria academia de dança, onde criava não só as coreografias como também confeccionava o vestuário e adereços. “Sempre tive o bichinho da costura. Talvez por isso, nunca coloquei de parte o sonho de criar os meus próprios chapéus e adereços”, adianta o profissional das artes do espectáculo que ainda hoje adora estar atrás dos holofotes e da fama.
Luís começou, então, a bater a várias portas e ouvir muitos ‘nãos’ até que, em 2002, recebeu um convite por parte do costureiro João Rolo e do encenador Filipe La Féria para criar um adereço para a gala dos 45 anos da RTP. Desde aí, nunca mais parou. Já participou com trabalhos seus para produções de Filipe La Féria como ‘My Fair Lady’, ‘A Canção de Lisboa’, ‘Jesus Cristo Superstar’, ‘O Feiticeiro de Oz’ e ‘Peter Pan’. Tem feito ainda vários adereços para teatro de revistas à portuguesa, para televisão, cinema, moda, dança e marchas populares de Lisboa.

“Os homens nunca foram muito bem vistos na dança”
Entusiasta do glamour e das tendências, Luís Stoffel revela que não foi fácil viver exclusivamente da dança e agora como chapeleiro e aderecista. Muitas vezes teve, e ainda hoje tem, de arranjar segundos trabalhos para pagar as contas e poder ter dinheiro para comer. “Os homens nunca foram muito bem vistos na dança e na criação de adereços e chapéus, mas quando nos falam dessas artes lembramo-nos sempre de profissionais do sexo masculino”, confessa Luís Stoffel.
E porque nem tudo são rosas e lidar com artistas tem muito que se lhe diga, Luís Stoffel confessa que uma das maiores dificuldades que sente cada vez mais é respeitar a exigências dos actores. “Sabemos que não é fácil actuar num palco, quanto mais com acessórios na cabeça ou aos ombros. Temos de pensar em tudo, senão vamos ouvir queixas”, admite o chapeleiro e aderecista, que é um dos poucos que se dedica a este ofício no país.