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Sucessores da Santa da Ladeira  mantêm obra social mas perderam fiéis
Maria Adélia Gaspar reza diariamente à "mãe Maria". O Santuário de Nossa Senhora das Graças mantém-se preservado

Sucessores da Santa da Ladeira  mantêm obra social mas perderam fiéis

A romaria que é feita no primeiro domingo de cada mês já não é o que era. Os milhares de devotos da “Mãe Maria” desapareceram. Resta o silêncio num santuário que vive apenas de memórias.

Duas pequenas capelas, uma catedral e dois lares de idosos constituem a obra deixada por Maria da Conceição Mendes Horta, conhecida por “Santa da Ladeira” que morreu fez dia 10 de Agosto 17 anos. O Santuário de Nossa Senhora das Graças mantém-se preservado, os edifícios estão imaculados mas falta-lhes fiéis. A primeira capela a ser construída foi deitada abaixo e reconstruída de raiz em 2019. Mas, desde Agosto de 2003, ano da morte da “irmã Maria”, tem-se acentuado o declínio de fiéis e visitantes ao santuário, no casal Garcia Mogo, freguesia de Meia Via, concelho de Torres Novas. Os dois lares de idosos albergam centenas de utentes.
Na região os devotos nunca foram muitos. Aliás, em Riachos, terra natal de Maria da Conceição, poucos são os que admitem ter visitado o local só por curiosidade. O primeiro domingo de cada mês é o dia dedicado à romaria, mas os tempos em que as centenas de autocarros, vindos sobretudo do centro e norte do país, enchiam a ladeira estão ultrapassados.
O santuário vê-se da estrada que liga Torres Novas ao Entroncamento, e para chegar até lá tem que se subir a ladeira, ainda em terra batida. A localização do santuário já aparece no GPS, mas placas indicativas a informar o caminho não existem. À medida que são percorridos os dois caminhos que dão acesso ao santuário ainda se podem ver as ofertas à santa. São na maioria imagens e estátuas oferecidas como agradecimento. O silêncio é apenas interrompido pelo tocar do sino no alto da catedral, para dar as horas.
O santuário pouca vida tem. Uma ou outra “irmã” passou pela reportagem de O MIRANTE, e assim que viam a presença mudavam de caminho em passo apressado. Parece um pequeno mundo dentro do mundo real. De quando em vez passa uma carrinha com funcionários dos lares de idosos a entrar ao serviço ou a transportar utentes ao hospital.
A Fundação Maria da Conceição Mendes Horta e Humberto Horta é gerida pelo bispo Estêvão Costa desde a morte da “irmã Maria”. O MIRANTE contactou o bispo que disse não estar disponível para dar entrevistas. O pacto de silêncio que parece haver em torno do santuário e da fundação é geral.
A pouca população que vive a escassos metros do santuário é, na grande maioria, constituída por pessoas que vieram de outras localidades para poderem estar mais perto de Maria da Conceição enquanto esta era viva. E por ali continuam a morar. Os terrenos foram adquiridos pela Santa da Ladeira, através de fundos doados pelos devotos e depois oferecidos a quem ali quisesse ir morar. Tocámos à campainha de algumas portas e poucos quiseram falar à nossa reportagem, quando a pergunta colocada era “o que é feito dos fiéis?”.

“A culpa do afastamento dos fiéis é do bispo Estêvão Costa”
Maria Adélia Gaspar foi das poucas pessoas que acedeu falar. Conhecemo-la à chegada à capela para fazer a reza diária de gratidão à “mãe Maria”, como lhe chama. Deixa o carrinho de compras que trouxe, para ir depois de rezar ao supermercado, e inicia o ritual. De joelhos à porta da capela, que está encerrada devido aos tempos de pandemia, reza à santa. Diz que a culpa do afastamento dos fiéis é do bispo. Será ele que, na sua opinião, “manda e desmanda” no património deixado pela santa. “Tiraram o altar que havia na catedral, mas depois lá o voltaram a pôr. Nunca percebi porque o tiraram”, refere.
As decisões do bispo Estêvão Costa que alguns fiéis não vêem com bons olhos não se ficam por aqui. A demolição da primeira capela mandada construir pela “mãe Maria” também não agradou a alguns. “Nunca mais lá fui. Só vi de longe. Fartei-me de gritar e chorar ao ver o entulho no chão quando demoliram a capela. Isto não se faz. Deviam ter restaurado e não construir uma coisa de novo. Mataram toda a santidade que estava inerente”, defende Maria Adélia Gaspar com lágrimas nos olhos.
Além de Maria Adélia Gaspar, outras fiéis que falaram quase às escondidas com O MIRANTE reiteraram a mesma ideia. “Ele o [bispo Estêvão Costa] é pouco acessível. A fé já está a passar por épocas difíceis. Se há pessoas que não cativam, pior ainda”, apontaram.

Santa da Ladeira: um fenómeno de crença popular

Maria da Conceição tinha fama de vidente e milagreira. Foi sepultada no jazigo feito a seu gosto, no Santuário de Nossa Senhora das Graças. Foi protagonista de um fenómeno de crença popular, nos anos 60, nunca reconhecido pela Igreja Católica. A Santa da Ladeira foi mais tarde apadrinhada pela Igreja Ortodoxa Polaca, que a excomungou pouco antes da sua morte.

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