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Presidente da Assembleia Municipal da Chamusca pouco interessado em ser candidato do PS à câmara

Francisco Velez acredita que a CDU iria perder mesmo que pudesse voltar a apresentar Sérgio Carrinho como candidato

Professor de música e músico confessa que inicialmente foi um dos críticos da instalação dos aterros e das empresas de reciclagem no Eco Parque do Relvão, explica que deixou de ser militante do PCP quando foi para a Chamusca porque lhe foi exigida obediência cega e acredita que o concelho necessita urgentemente de novas ideias para poder trilhar os caminhos do progresso e travar o envelhecimento e a desertificação.

O seu gosto pela música vem de criança. E o seu gosto pela política também começou aos 10 anos de idade? Não foi aos 10 anos mas foi aos 14, a seguir ao 25 de Abril. Em 1975 era militante da UEC (União dos Estudantes Comunistas). Os meus pais eram militantes do Partido Comunista. Eu também fui militante. Lá em casa falava-se muito de política. Quando deixou de ser? Quando vim de Pernes para a Chamusca. Vim encontrar no PCP daqui uma série de coisas de que, na altura, não gostei. Havia uma obrigatoriedade de uma obediência cega. Não havia debate e isso comigo não dá. Agora é militante do PS?Sou. Inscrevi-me em 2009, a seguir às eleições. Teve que ser. A maior parte das pessoas que entrou nas listas do PS era independente. Inscrevemo-nos no partido para podermos participar nas discussões. Mas estou lá com as minhas ideias e com a minha responsabilidade. Não fui para lá abanar que sim com a cabeça. Quantas vezes votou no Sérgio Carrinho (PCP) para presidente da câmara? Votei algumas. Já ganhou o gosto pelo exercício de cargos políticos? Se agora o convidarem para ser candidato a presidente da câmara municipal aceita? Ganhei gosto pelo cargo que exerço, confesso. Acho que todos os cidadãos deveriam candidatar-se se fossem desafiados para tal. Ser cidadão é intervir na sociedade, seja através da política ou de qualquer outra actividade em que se possa ser útil aos outros. No seu caso ser útil aos outros pode passar por ser candidato do PS à presidência da câmara nas próximas eleições? Eu não tenho qualquer ambição de ser presidente de câmara. Ser presidente de câmara obrigava-me a largar coisas que eu gosto de fazer. Não tinha a mesma disponibilidade para andar no mundo da música e tinha que deixar de dar aulas. Mas atenção, nunca me tinha passado pela cabeça ser presidente da assembleia municipal e lá estou eu. Nunca digas nunca, é isso?É. Mas dentro do PS da Chamusca temos uma série de alternativas para uma candidatura e qualquer uma dessas pessoas, se for eleita, dará um bom presidente. E a CDU?Eu não gosto muito de falar nos outros mas a CDU tem a esse nível uma tarefa bem mais complicada. A CDU só não recandidata o Sérgio Carrinho porque já não pode. Agora, assim de repente é que vão encontrar um candidato? O que fizeram ao Sérgio ao amarrarem-no ao cargo durante mais de trinta anos não se faz a ninguém. Isto desgasta uma pessoa. Mata uma pessoa. Não é desanimador saber que, se o PS vier a ganhar as próximas eleições, isso só acontece porque o Sérgio Carrinho já não é candidato?Não sei se isso é verdade. Nas últimas eleições, embora o candidato fosse o Sérgio, as coisas não correram bem à CDU. Se ele concorresse outra vez estou convencido que perdia, até porque os eleitos do PS têm mostrado trabalho e isso pesa na altura de decidir em quem votar. As conversas informais entre amigos e conhecidos são mais estimulantes que as das reuniões da assembleia?Completamente. Muito mais estimulantes. Na assembleia as pessoas estão em representação de partidos e as suas intervenções têm que reflectir as posições do seu partido. Estão espartilhadas. Eu posso falar pelo PS. Muitas das discussões entre nós são muito mais vivas e interessantes do que as que temos depois com os outros partidos na assembleia.Antes de ser presidente da assembleia municipal assistiu a alguma reunião daquele órgão como mero cidadão? Fui a uma por curiosidade e não gostei. Foi uma daquelas que durou até às cinco da manhã como era habitual antes deste mandato. Aquilo era uma coisa medonha. Depois ainda assisti à última reunião da assembleia antes das eleições de 2009. Mas vou ser sincero, também não gostei. Fizeram um intervalo lá para a uma ou duas da manhã e eu fui-me embora.Gosta da sensação de lhe chamarem senhor presidente?Ao princípio era um pouco estranho mas acabei por me habituar. Se fui eleito tenho que dignificar a função. Já acabaram as tais assembleias até às cinco da manhã. Foi uma das suas vitórias?O mérito não foi apenas meu, foi de todos os eleitos que souberam compreender a necessidade de encurtar as intervenções. Acho que os actuais eleitos são mais pragmáticos.Faz-se muita politiquice na assembleia?Alguma. É inevitável. Mas a Assembleia Municipal da Chamusca não é seguramente das piores. Nos assuntos mais importantes para o concelho os partidos estão unidos. Na defesa dos cuidados de saúde. Na necessidade de desenvolver o Eco Parque do Relvão. Agora é fácil elogiar o papel do Eco Parque e efectivamente os partidos uniram-se, mas nem sempre foi assim. É verdade. Eu próprio era uma daquelas pessoas que era contra. Mas isso teve a ver com a minha vivência em Pernes e com o gravíssimo problema que lá existe a nível ambiental com o Alviela, que ainda hoje está por resolver. Claro que agora todos temos que reconhecer a sua importância. Pena é que muito do que estava programado não se vá cumprir por causa da crise e que possa haver empresas que vão fechar.Professor, músico e... políticoA entrevista decorre na casa do entrevistado, um terceiro andar de onde se vê quase toda a vila da Chamusca. O presidente da assembleia municipal veste uma camisola de algodão de manga curta, preta com o logótipo do conjunto de rock a que actualmente pertence: “a ruína”. Em conversa informal convida-nos a ir ao Youtube ouvir as músicas já gravadas. Natural de Riachos de onde saiu com um ano de idade, Francisco Velez viveu em Pernes até aos 19 anos. Ali fez a escola primária e ali aprendeu a tocar com mestres como o maestro Santos Rosa cuja orquestra integrou mais tarde durante três anos. O liceu e os estudos de música mais avançados foram feitos em Santarém. Aceita tirar algumas fotografias com uma viola ao lado embora a sua especialidade sejam os teclados. Lembra passagens por grupos de baile como o Sadeom, o Nova Experiência ou o 4004 e por grupos de música popular portuguesa como os Tejo Novo. Tocou também no efémero grupo pop Alémmar e acompanhou músicos como José Cid e Adelaide Ferreira.Começou a dar aulas de música no ensino oficial em 1994. Antes disso já dava aulas em escolas particulares. Há quatro anos que está colocado em Abrantes. “Gosto muito da profissão que tenho e das outras actividades que desenvolvo, tanto na música como na política. Sou um sortudo”, afirma. Conta como foi o seu primeiro contacto com a música. “Tinha 10 anos e andava no ciclo preparatório. Uma professora que nós tínhamos tocou uma música qualquer num órgão e perguntou se havia alguém capaz de repetir. Fui o único a oferecer-me para tentar e toquei aquilo à primeira. Nunca tinha mexido num instrumento. O meu pai ficou impressionado. Comecei a aprender solfejo com o tio do maestro Santos Rosa, o Pena Rosa. Mais tarde ainda tentaram que eu fosse para a banda tocar saxofone mas eu não gostava de bandas”. O pai, que era motorista, queria que ele fosse advogado e não achou muita piada ao seu interesse pela música. Disse-lhe que estava disposto a pagar-lhe os estudos mas que não lhe dava dinheiro para a música. Disse e cumpriu mas na adolescência ainda lhe trouxe um pequeno teclado de Itália e uma guitarra de Espanha. “Ainda por cima quando me trouxe a guitarra foi no ano em que chumbei. Ele não achou graça nenhuma”, lembra. Fuma vários cigarros ao longo da hora e meia que dura a conversa. De cada vez que acende um, tem o cuidado de entreabrir a porta da varanda para arejar a sala. No início da conversa senta-se num sofá de frente para a televisão acesa mas sem som onde passa um jogo de futebol. Entre ele e o jornalista vai estar sempre um computador portátil aberto. Foi militante das organizações juvenis do PCP e do próprio PCP até ir para a Chamusca. Afastou-se do partido nessa altura e alheou-se da política durante uns anos sem nunca perder o gosto pelo debate e discussão de ideias. Em determinada altura, a pedido do amigo Rui Martinho, aceitou integrar, como suplente, uma lista de candidatos do PSD à câmara municipal. “Foi só porque faltava lá um nome” justifica-se. Gradualmente foi-se aproximando do PS, influenciado por outros amigos. Em 2009 foi cabeça de lista daquele partido à assembleia municipal e devido à correlação de forças e a divisões do seio da coligação PSD/CDS acabaria por ser eleito presidente daquele órgão, por um voto.“Sou contra radicalismos” Uma das poucas fontes de rendimento do concelho da Chamusca são os eucaliptos. Mas os ambientalistas criticam a excessiva “eucaliptização”. Qual é a sua opinião?Já reflecti sobre isso. Percebo os ambientalistas até porque também me considero um ambientalista mas a maior parte dos terrenos do concelho da Chamusca onde estão a ser plantados eucaliptos não davam para mais nada e para nós o eucalipto é importante a nível económico. Na sua qualidade de ambientalista como encara as críticas do eleito do BE na assembleia municipal, Duarte Arsénio, ao funcionamento dos CIRVER (Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos) instalados no Eco Parque do Relvão?É fácil criticar mas tem que haver fundamentação. Ele veio com aquela história da radioactividade mas depois disso esteve como eu estive numa formação sobre o assunto onde foram dados esclarecimentos pelos responsáveis pelos CIRVER e concluiu-se que a única coisa que poderá ter havido foi uma falha de comunicação. Estar a insistir no assunto como se estivéssemos sob a ameaça de uma bomba atómica é fundamentalismo. O que pode ser feito para resolver problemas do concelho da Chamusca como a falta de emprego e o progressivo envelhecimento da população?Perdemos 11,9 por cento da população em dez anos. Uma média de 100 habitantes por ano. A taxa de envelhecimento é de 2,9. Por cada jovem há quase três idosos. E a tendência é para piorar. O envelhecimento é geral mas toda a gente se vai embora porque aqui não há emprego. Os meus filhos saíram daqui. A minha filha mora no Entroncamento. O meu filho vive aqui mas trabalha em Santarém.O que pode ser feito?Temos discutido muito essa situação no seio do PS. O Eco Parque do Relvão foi uma boa aposta mas a crise não perdoa e é provável que algumas empresas fechem e outras não cheguem a instalar-se. A câmara municipal tem que fazer mais do que foi feito até aqui. As autarquias têm que criar outras condições. Aqui há dias um casal do concelho que trabalha aqui, foi viver para a Barquinha, por exemplo. É por causa do desenvolvimento cultural, principalmente. Na Chamusca há a Semana da Ascensão e mais nada. Temos que fazer mais. Eu falo neste assunto porque é da minha área mas há ideias que serão apresentadas ao eleitorado na altura própria. Se o PS ganhar as eleições nada vai ser como antes. Vai ter que haver um corte com o passado.

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