Duas décadas de trabalho sem reclamações
Conceição Violante, 60 anos, é recepcionista no Hospital Distrital de Santarém. Conceição Violante é o rosto simpático que recebe grande parte dos utentes do Hospital de Santarém, há 23 anos. Em mais de duas décadas orgulha-se de não ter tido uma única reclamação, sentindo-se realizada por conseguir aplicar no local de trabalho os mesmos valores que lhe regem a vida, “acima de tudo ajudar o próximo”.
Conceição Violante tem a categoria profissional de assistente operacional, mas na prática é recepcionista e dá a cara pelo Hospital Distrital de Santarém há 23 anos. Formada no Curso Geral de Formação Feminina, na antiga Escola Industrial e Comercial de Santarém (actual Ginestal Machado), lembra que a 25 de Abril de 1974 estava numa aula de culinária quando se deu a revolução. “Era muito nova e não tinha noção de nada, nem eu nem o meu irmão, que chegou a estar um dia preso porque foi apanhado a cantar Zeca Afonso”.
Depois do curso e do casamento teve alguns trabalhos até, por intermédio do Centro de Emprego, ser seleccionada para a posição que agora ocupa. É com orgulho que nos revela que veio inaugurar este tipo de serviço. “A nível nacional fomos o primeiro hospital a ter recepcionista, foi um modelo que a Dr.ª Conceição Carvalho viu no estrangeiro e quis adoptar em Santarém”. Na altura, diz, vinham vários directores de outros hospitais ver como funcionava o serviço, recorda, entre outras, a visita do director do Garcia de Orta, em Almada.
A função teve tanto sucesso que foi alargada a outros departamentos dentro da unidade hospitalar, passando a existir também serviço de informações e relações públicas nas urgências e nas consultas externas. Conceição já passou por todos eles, mas foi a passagem pelas urgências que mais a marcou. Diz também que foi onde se sentiu mais útil, acrescentando que muitas vezes “não temos noção do que somos capazes de fazer e de aguentar, até passar pelas situações”.
Há vários casos que guarda frescos na memória, mas um traz-lhe as lágrimas aos olhos só de o relembrar. Vem exactamente do tempo em que estava no serviço de urgências. Há uns anos deu entrada nas urgências um rapaz com cerca de 20 anos, vítima de um acidente de viação. O seu estado era crítico e foram chamados os familiares. Prontamente chegou uma tia, irmã do pai, mais tarde chegou o pai, mas já sem vida. O progenitor trabalhava numa pedreira e, quando se preparava para ir ter com o filho ao hospital, foi esmagado por uma rocha. Conceição lembra os momentos de aflição da tia, que por um lado chorava a morte do irmão e por outro tentava animar o sobrinho. Foi ela o ombro amigo para a tia devastada.
Conceição também gosta de lembrar as situações mais divertidas. Recorda que, de início, quando muito poucos conheciam o serviço, usavam ao ombro, junto com a farda de saia e casaco azul escuro debruado a verde, um lenço nos mesmos tons. Eram tratadas como hospedeiras de bordo e muitas vezes dirigiam-se-lhes como “senhoras do lencinho”.
Actualmente está na recepção principal do hospital, no piso zero, onde dá informações gerais a pacientes e a acompanhantes de pacientes. Adora o seu trabalho e não o trocaria por nenhum outro, mesmo quando, por vezes, se gera alguma confusão porque alguém não respeitou a fila do atendimento. “Durante todos estes anos nunca tive uma reclamação, deve ser sinal que faço um bom trabalho”, diz orgulhosa e de sorriso rasgado.
Os valores por que se rege, na vida e no trabalho, são os mesmos, acima de tudo ajudar o próximo. “São os valores que os meus pais me transmitiram, o respeito mútuo, o saber colocar-me no lugar do outro”.
Conceição chega sempre bem-disposta ao trabalho, mas admite que, por vezes, há colegas que a tiram do sério.