“Procuradoria ilícita é um problema social que solicitadores e advogados enfrentam”
Luís Coelho, 51 anos, é solicitador em Alverca há 21 anos. Já foi agente de execução e sonhou ser arqueólogo
Resolver um problema de partilhas, doações ou de dívida são assuntos que tanto podem ser tratados por um solicitador como por um advogado. Mas o modo de trabalho destes profissionais é distinto. “Os solicitadores têm um sentido mais prático e evitam a todo o custo que o processo vá parar aos tribunais, evitando perda de tempo e dinheiro para o cliente que estão a representar”. A opinião é de Luís Coelho, solicitador que um dia sonhou ser arqueólogo de conservação e restauro.
Natural de São João dos Montes, concelho de Vila Franca de Xira, tem 51 anos e foi o primeiro no concelho a abrir um Balcão Único do Solicitador, sediado em Alverca do Ribatejo. Luís Coelho diz que “o solicitador está mais predisposto ao diálogo com as partes” na resolução de um caso de dívidas ou partilhas. Nestas situações convoca a contraparte e tenta chegar a um consenso, para evitar que “o caso vá para tribunal”. E o que traz isso de benéfico para o seu cliente? “O processo é mais célere, o cliente não necessita de contratar um advogado para o defender em tribunal e não terá de pagar taxas de justiça”, diz.
Entre o trabalho de escritório e o trabalho de campo, Luís Coelho entra ao serviço às 09h00 e não despega antes das 19h00, de segunda a sexta-feira. Aos sábados de manhã trabalha por marcação. Na sua profissão está habilitado para trabalhar, entre outros, com contratos de arrendamento, compra e venda de imóveis, doação, partilhas, permutas, procurações, autos de constatação, registos predial, automóvel e comercial. Também apoia e acompanha a criação de associações e sociedades comerciais.
Tinha 30 anos quando surgiu a oportunidade de tirar o curso de solicitadoria, na altura ministrado pela Ordem dos Solicitadores. Fê-lo em horário pós-laboral, para conciliar com o trabalho que iniciou aos 19 anos como funcionário da Divisão de Urbanismo na Câmara de Vila Franca de Xira. Depois de terminar o ensino secundário na Escola Reynaldo dos Santos, queria seguir arqueologia de conservação e restauro, mas o destino cortou-lhe as asas.
Confessa que o “período mais difícil” da sua carreira foi como agente de execução de 2003 a 2008. “O país não estava preparado para ter profissionais da prática privada a trabalhar em colaboração com os tribunais e com funções estritas a funcionários judiciais”. Os casos que mais gosta de resolver são questões de partilhas entre familiares. “Atendo o cliente, traço a estratégia e atribuo um prazo para o resolver. Não gosto de ter trabalho a amadurecer”, afirma.
O balcão que descomplica
Luís Coelho diz-se um profissional atento aos desenvolvimentos na sua área. Esta postura fez com que fosse o primeiro a abrir um Balcão Único do Solicitador, em todo o concelho de Vila Franca de Xira.
A criação do Balcão Único em 2010 foi, na perspectiva de Luís Coelho, uma das maiores conquistas da Ordem dos Solicitadores. Com recurso às novas tecnologias, as pessoas podem resolver os seus problemas, como por exemplo formalizar um contrato, sem sair do escritório do solicitador. Por outro lado, “a marca veio trazer uma maior projecção do trabalho do solicitador, que passou a estar mais visível ao público” e com “uma imagem uniforme”, explica.
Usurpação de função é recorrente
“A procuradoria ilícita é um problema social que solicitadores e advogados enfrentam constantemente”. O esquema é simples: “Pessoas nas mais variadas profissões recebem formação que os ajuda a perceber determinados assuntos, mas isso não os habilita a poderem executá-los”. Luís Coelho explica a O MIRANTE que o público por vezes recorre a profissionais de outras áreas que estão a usurpar funções a solicitadores e advogados, sem habilitação legal para tal.
“Já recebi pessoas com contratos de arrendamento e actas de sociedades que foram elaborados sem o menor critério e rigor. Alguns vêm até escritos em português do Brasil”, conta. Nestas situações o mais gravoso é que “os direitos das partes não ficam salvaguardados” e em caso de incumprimento de um dos indivíduos “torna-se mais difícil resolver o problema”.
“A Ordem dos Solicitadores trava há anos uma luta para denunciar esta prática, que descredibiliza os actos próprios nos quais intervém”, diz. Quem recorre a estes profissionais de outras áreas para tratar de assuntos que só podem ser tratados por um advogado ou solicitador “nem tem consciência de que está a ser envolvido na procuradoria ilícita”, um acto condenável por lei, por crime de usurpação de função.