O ensino e o investimento produtivo devem ser prioridades de uma região
Antigo ministro das Finanças Eduardo Catroga apresentou livro na Biblioteca Municipal António Botto.
O economista tem uma grande ligação à sua terra natal, São Miguel do Rio Torto, concelho de Abrantes, onde nasceu há 76 anos e que visita de 15 em 15 dias. Eduardo Catroga recordou a sua infância e os tempos em que para jogar futebol havia mais meninos descalços do que calçados. No dia 11 de Julho apresentou o seu livro, “Gestão, Política e Economia – Vivências e Reflexões”, na Biblioteca de Abrantes. Actualmente, está a ajudar a criar a Casa-Museu de São Miguel do Rio Torto, recolhendo memórias da aldeia em articulação com a história que está a ser escrita sobre a freguesia.
O que faz falta no concelho de Abrantes?
Atrair empresas que criem riqueza e que criem postos de trabalho. Sem postos de trabalho as pessoas não se fixam cá. Não são necessários empregos públicos, esses já existem suficientes. As empresas são a célula base da actividade económica. Estimular o crescimento das empresas que já existem, atrair novos projectos e novas iniciativas, quer dos agentes locais, quer de agentes estrangeiros.
Os autarcas da região deviam ser mais unidos na defesa dos interesses da região?
A defesa da região passa por conseguir algumas infra-estruturas. Justifica-se uma nova ponte sobre o rio Tejo, na zona de Constância, que facilite as ligações mais a sul da região. O desenvolvimento do caminho-de-ferro que também está semi-morto. As escolas profissionais têm que ser expandidas. Nem toda a gente tem vocação para ir para a universidade mas todos têm que ter uma profissão. O desenvolvimento da preparação profissional dos jovens é fundamental, assim como o desenvolvimento de uma aprendizagem permanente. O desenvolvimento das escolas profissionais, o desenvolvimento da literacia digital e a atracção de investimento produtivo devem ser prioridades para a região.
A desertificação e quebra demográfica acentuada é irreversível ou há forma de dar volta ao actual cenário?
As pessoas quando tiveram novos horizontes deslocalizaram-se para zonas do país e do estrangeiro onde encontraram actividades mais bem remuneradas. A chamada desertificação pode ser contrariada através de políticas adequadas capazes de atrair actividade económica produtiva, que é fundamental.
Abrantes tem vindo a perder protagonismo regional?
A importância de uma região está muito ligada ao seu peso económico. Quanto menor for o peso relativo de Abrantes face, por exemplo, ao concelho de Tomar e a outras comunidades, menor será o peso da opinião abrantina na definição de políticas. Abrantes tem tido bons protagonistas políticos mas há que mobilizar mais a sociedade civil, as empresas na região, as associações empresariais, com impacto na região. Chamar empresários locais e nacionais instalados na região no sentido de contribuir com ideias para o seu desenvolvimento. Independentemente dos órgãos políticos, faz falta um conselho alargado que dê ideias para o desenvolvimento do concelho.
Há algum político desta região que, na sua óptica, pudesse desempenhar esse papel aglutinador?
Os políticos têm o seu papel mas a sociedade civil também tem que fazer o seu papel. Tem que se ir tentando contribuir um maior equilíbrio regional. Abrantes já teve 50 mil pessoas, hoje tem 35 mil. Este decréscimo está relacionado com o envelhecimento da população, o desaparecimento de certas actividades económicas, o desaparecimento do serviço militar obrigatório, que trazia pessoas para Abrantes. Ninguém tem soluções milagrosas para o problema da tendência de deslocalização das populações para os grandes centros. Já há movimentos inversos em muitos países e mesmo cá. Hoje já há produção cultural, infra-estruturas, a cidade está a hora e meia da capital. O que falta são actividades económicas para atrair e fixar talento e pessoas.
O ex-ministro que ensinou adultos a ler e escrever quando era criança
Vários amigos e admiradores de Eduardo Catroga marcaram presença no auditório da Biblioteca Municipal António Botto, em Abrantes, para assistir à apresentação do livro do antigo ministro das Finanças, intitulado “Gestão, Política e Economia – Vivências e Reflexões”, que decorreu na tarde de quinta-feira, 11 de Julho. Eduardo Catroga não escondeu a emoção ao rever os seus amigos, alguns de infância. O economista tem uma grande ligação à sua terra natal, São Miguel do Rio Torto, concelho de Abrantes, onde nasceu há 76 anos e que visita de 15 em 15 dias.
Catroga recordou a sua infância e os tempos em que para jogar futebol havia mais meninos descalços do que calçados. “Eu fazia parte do grupo dos calçados, por ter mais posses económicas, mas se queria jogar à bola tinha que me descalçar”, lembra. Frequentou a escola primária da aldeia até aos dez anos. Com essa idade ensinou pessoas mais velhas, da sua terra, a ler e a escrever. Foi aluno fundador da Escola Industrial e Comercial de Abrantes (EICA), em 1953, tendo sido o primeiro aluno dessa escola a concluir um curso superior, como era desejo do seu pai: ter pelo menos um filho doutor. Acabou por ter dois filhos licenciados uma vez que o seu irmão, Fernando Catroga, é historiador e professor do ensino universitário.
O antigo ministro das Finanças, do Governo de Aníbal Cavaco Silva - entre 1993 e 1995 -, licenciou-se em Finanças no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras. Recebeu o prémio Alfredo da Silva pela classificação mais elevada do curso. O ano passado foi alvo de uma homenagem por parte das gentes da sua terra ao ter um largo na sua aldeia com o seu nome.
“Havia um sonho antigo da terra em remodelar a praça local que estava degradada e onde havia um ringue de patinagem, todo enferrujado. Ajudei a angariar fundos para o desenvolvimento do projecto e transformaram o espaço num jardim, deslocando o recinto desportivo para outra zona. No final decidiram homenagear-me e fiquei muito sensibilizado com o gesto”, confessou a O MIRANTE antes da apresentação do seu livro.
Eduardo Catroga foi o primeiro presidente da associação dos antigos alunos da EICA e ainda é o presidente da assembleia-geral desta escola. Participa com regularidade nos convívios de antigos alunos. Actualmente, está a ajudar a criar a Casa-Museu de São Miguel do Rio Torto, recolhendo memórias da aldeia em articulação com a história que está a ser escrita sobre a freguesia.
Também está a tentar dinamizar, em conjunto com a junta de freguesia e a casa do povo local, um projecto de literacia digital junto dos mais velhos. “A literacia digital é o novo tipo de analfabetismo e queremos combatê-lo ensinando os mais velhos a mexerem nas novas tecnologias, que é fundamental para abrir horizontes a nível de informação e comunicação”, referiu.