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Quando não havia telemóveis os camionistas trocavam mensagens com a família pela rádio
José e Idalina Santos

Quando não havia telemóveis os camionistas trocavam mensagens com a família pela rádio

Histórias de quem passou a vida agarrado ao volante contadas à mesa. O II Convívio de Camionistas juntou centena e meia de camionistas e familiares no sábado, 24 de Agosto, na aldeia de Fráguas, concelho de Rio Maior. O MIRANTE esteve lá e conta-lhe histórias de quem passou uma vida atrás de um volante e de quem ficou em casa à espera.

Hermínia e Jacinto Carneiro
César Henriques e Cila Santos

Hermínia e o marido Jacinto Carneiro foram dos primeiros a chegar à Associação de Solidariedade Social Cultural e Desportiva de Fráguas. Vêm de Santa Iria de Azoia (Loures) e o II Convívio de Camionistas em Fráguas, Rio Maior, organizado por essa colectividade, serve também para comemorar o final de uma vida de trabalho como camionista de Jacinto. “Foram quarenta anos, dois meses e três dias”, diz-nos Jacinto.
Despediu-se da actividade na semana passada e vai agora fazer companhia a Hermínia que confessa que o mais difícil foi ficar 10 a 15 dias sem saber do marido e ter que criar sozinha o filho, sentindo-se muitas vezes no papel de pai e de mãe. “Nos primeiros tempos foi muito complicado porque não havia as facilidades que há hoje. Não havia telemóveis e ficávamos muito tempo sem notícias”.
Hermínia, agora reformada, trabalhou no Depósito Geral de Material de Guerra, em Moscavide, e durante o dia estava ocupada. As noites é que eram mais complicadas. A sua companhia era a pequena telefonia onde durante a noite ouvia o programa do António Sala, “Estrada Fora”, através do qual trocava mensagens com o marido. Para lembrar esses tempos, há dois anos Jacinto surpreendeu-a no Dia dos Namorados ao entrar em directo no programa da Antena 1, “Há Conversa”, com José Candeias.

Passar uma semana fora não é problema desde que não falte o telemóvel
César Henriques não tem tempo a perder. Anda de volta dos assados e o suor cai-lhe em bica. É ele o responsável pela organização do Convívio de Camionistas e quer que tudo corra bem. Antes deste encontro, que vai na segunda edição, foi responsável por um em Setembro do ano passado e outro “mais familiar”, em Asseiceira, em 2017.
A esposa, Cila Santos, acompanha-o nesta roda viva e, sempre que as férias de ambos não são coincidentes, acompanha-o também nas viagens mais longas pela Europa. Gostava ela própria de ser camionista, mas como não tem carta de pesados dedica-se ao trabalho como administrativa numa serralharia perto de Rio Maior. O pai de Cila também foi motorista e a família chegou a estar oito dias sem saber dele. Agora, confessam, tudo está facilitado e passar uma ou duas semanas fora não é problema desde que não falte o telemóvel.
César graceja que o camião é o seu apartamento e que quando regressa a casa, uma vivenda, parece que está de férias.

43 anos sem uma avaria
Mais à frente, a virar frangos no espeto, encontramos Carlos Tomás, presidente da Associação de Solidariedade Social Cultural e Desportiva de Fráguas há dois anos. Também ele foi motorista. Transportava adubos e cereais para uma empresa de Fráguas. Viajou muitas vezes para Espanha e Itália e em 43 anos de estrada nunca teve uma avaria.
José Santos, o vice-presidente da associação, deixou de conduzir pesados em Novembro de 2018. Trabalhou seis anos para a Tecnovia e 28 anos na Ribeiro e Esteves, uma empresa de materiais de construção em Tremês. Os seus trabalhos foram quase sempre em Portugal, só raramente tinha que se deslocar a Espanha para ir buscar materiais. A mulher, Idalina, não se queixa pois “todas as noites dormia em casa”.
José Santos explica-nos o motivo de haver tantos camionistas na pequena aldeia de Fráguas. “É uma terra com pouca ou nenhuma indústria e as pessoas viram-se para o que há de trabalho, calhou assim, não há outra explicação”, diz com um encolher de ombros.

Nelson Filipe com José Santos

Só um motorista de matérias perigosas mas com o apoio de todos

Entre mais de uma centena de motoristas encontramos apenas um de matérias perigosas. Nelson Filipe é um dos mais jovens presentes no convívio, tem 36 anos e conduz camiões há 14. Há um ano e meio trabalha para a Atlantic Cargo no transporte de matérias perigosas. Fez greve das duas vezes porque defende melhores condições de trabalho e menor carga horária. Chega a trabalhar 15 horas seguidas, mas não abdica de ir dormir a casa todos os dias, onde tem mulher e uma filha de 14 anos.
Nelson refere que faltam motoristas para o transporte de matérias perigosas e que as empresas estão com dificuldade em recrutar. Por isso têm que fazer horas extraordinárias. No sábado do evento, 24 de Agosto, só por acaso não trabalhou. Confessa que ainda foi sondado, mas já tinha o compromisso do convívio. Apesar de ser o único representante da classe no que toca ao transporte de matérias perigosas, todos os camionistas com quem falámos se mostraram solidários com a causa e admitem que é muita responsabilidade para um ordenado tão baixo.

Quando não havia telemóveis os camionistas trocavam mensagens com a família pela rádio

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