Maria Laura Leonardo, a primeira mulher a entrar como Conselheira do Supremo Tribunal de Justiça 30 anos depois do 25 de Abril
A primeira mulher a entrar para conselheira do Supremo Tribunal de Justiça aconteceu 30 anos depois do 25 de Abril de 1974. Com uma particularidade. Maria Laura Leonardo foi a primeira classificada no vestibular do Supremo onde só concorriam juízes homens.
A entrada de Maria Laura Santana Maia Leonardo para conselheira do Supremo Tribunal de Justiça, a primeira mulher a ter a honra de erguer aquelas vestes, deu-se em 2004, trinta anos depois do 25 de Abril de 1974. Estes trinta demorados anos que passaram até uma mulher chegar ao cargo, foram recordados num artigo de Maximiano do Vale, vice-presidente da Associação Sindical de Juízes na revista Visão, mas onde faltou um pequeno pormenor. Maria Laura Santana Maia Leonardo só entrou, mesmo assim, passados tantos anos, porque foi a primeira colocada no vestibular do Supremo, num concurso a que concorreram só juízes homens.
O MIRANTE volta a recordar a morte da Juíz, natural da Ponte de Sor, que em 2009, num artigo publicado na revista Julgar, escrito já depois da reforma, dá conta da sua felicidade por já estar desligada dos tribunais, ao reconhecer que “fazendo um confronto entre o passado e o presente, nos tempos que correm, a vida dos magistrados é mais difícil, e atribui essa dificuldade ao facto de “ vivermos num clima social de crescente desconfiança por tudo o que é institucional, sobre uma pressão mediática muito intensa e tendo como pano de fundo um mundo dominado asfixiantemente pelas vertentes económica e financeira”.
As duas grandes amigas
Nas redes sociais, Santana-Maia Leonardo, seu filho, lembra a grande união entre a sua mãe e a sua neta Graça, de 5 anos, “a grande amiga da minha mãe nos últimos 4 anos de vida, passando com ela praticamente todos os seus tempos livres.
E a minha neta não gostava sequer que ninguém fosse para o pé delas.
Com a minha mãe, aprendeu a desenhar, ler, escrever e fazia jogos e brincava. Este ano dei com elas no quarto da minha mãe a jogarem à bola. Nunca imaginei a minha mãe com 87 anos de idade e já doente a jogar à bola”, escreveu na sua página do Instagram com uma fotografia que ilustra este texto.
No tempo em que o destino das mulheres era ficar em casa para cuidar dos filhos.
Num curto depoimento para O MIRANTE, Santana-Maia Leonardo recordou que na vida da sua mãe nada foi fácil para chegar onde chegou, e recordou tempos antigos “A Minha mãe tinha sido uma das melhores alunas do Colégio de Nossa Senhora de Fátima em Abrantes, mas meu avô achou que, depois de ter concluído o 5º ano (hoje equivalente ao 9º ano), não deveria continuar estudando. Foi um grande desgosto para a minha mãe, porque ela era uma aluna brilhante e desejava prosseguir os estudos. Mas o meu avô era um homem muito conservador e achava que o destino das mulheres era ficar em casa para cuidar dos filhos.
Minha mãe casou com 19 anos de idade com meu pai que era licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra e, na época, tinha 26 anos de idade.
Meu pai morreu em Setúbal no dia 1º de dezembro de 1967, quando minha mãe tinha 30 anos e dois filhos menores com 7 e 9 anos de idade. Tinha apenas o 5.º ano dos Liceus (hoje, o 9.ºano) e veio viver para Ponte de Sor para casa dos seus pais, porque não tinha meios de subsistência. No entanto, minha mãe não queria ficar vivendo às custas dos pais e então decidiu estudar. Tinha para isso que completar o 7º ano dos Liceus. Em Fevereiro de 1968, dois meses após o meu pai falecer, foi falar com a Dr. Virgínia Fernandes, professora de alemão e amiga da sua mãe, para a preparar para o exame de alemão. Disse-lhe a Dr. Virgínia Fernandes: "Ó mulher, tu és doida! Mas tu queres aprender a falar alemão em 3 meses?" E a minha mãe respondeu-lhe: "Eu não quero aprender a falar alemão, porque eu vou dispensar da oral".
E não só dispensou da oral de alemão com 16 valores como foi essa a nota mais baixa que teve nos exames desse ano com que concluiu o 7.º ano (hoje, 12.º ano), tendo realizado ainda nesse ano o exame de admissão que lhe permitiu aceder à Faculdade de Direito de Coimbra, tendo concluído o curso de Direito como voluntária em Março de 1973 com 16 valores”.


