A poesia como terapia para o desemprego
No XI Encontro de Poetas do Concelho de Vila Franca de Xira quatro poetas foram convidados para falar das suas obras com o público presente. Isabel Brito Fonseca contou a O MIRANTE como a poesia a ajudou a preencher o vazio do desemprego.
Um sítio para gente que ama poesia. Assim foi descrito o XI Encontro de Poetas do Concelho de Vila Franca de Xira, que decorreu na tarde de sábado, 24 de Março, no salão nobre do Palácio da Quinta da Piedade, na Póvoa de Santa Iria, inserido nas comemorações municipais do Dia Mundial da Poesia, celebrado a 21 de Março.
Sentada no painel de poetas convidados estava Isabel Brito Fonseca que aos 46 anos encontrou na poesia uma forma de dar a volta ao desemprego. Desde criança que viu ser-lhe incutido o gosto pela literatura e foi já mais tarde que começou a preferir a poesia à prosa. Profissional na área de educação e formação de adultos, Isabel, natural de Vila Franca de Xira, nunca teve muito tempo para dedicar à sua paixão mas tudo isso mudou quando se viu desempregada. “Achei que em vez de ficar a deprimir e a olhar para o ar podia aproveitar o meu tempo para fazer aquilo que gosto verdadeiramente”, conta a O MIRANTE.
Das várias publicações de pequenos poemas em colectâneas a escrever um livro inteiramente da sua autoria foi um pequeno passo. Em 2017 lançou “Metamorfose e Supernovas” a convite da Pastelaria Studios, integrado na colecção “A Poesia pode durar um dia”. Nesse livro aproveitou para “inventar realidades diferentes” e a experiência acabou por ter um resultado bem melhor do que o que estava à espera com algumas centenas de exemplares já vendidos.
Ainda assim, Isabel Brito Fonseca recusa ser considerada uma poetisa, referindo que é apenas uma pessoa que gosta muito de ler e escrever e que isso vai continuar a ser apenas um passatempo. “O desemprego é sempre mau, mas proporcionou-me um momento que me deu bastante prazer porque estava a fazer efectivamente aquilo que gosto”, explicou. Isabel voltou a exercer a profissão, o que lhe retirou o tempo necessário para escrever poesia. Contudo, ainda mantém a ideia de ir lançando alguns textos e não recusa a hipótese de voltar a lançar outro livro.
Ao lado de Isabel Brito da Fonseca, sentaram-se Agripina Moreira, de 80 anos, e residente na Póvoa de Santa Iria, Manuel da Piedade, de 65 anos, que veio de Alhandra, e Rodolfo Barquinha, de 35 anos, e natural de Vila Franca de Xira. Os quatro compuseram o painel de poetas convidados a discutir as suas obras com o público presente que acabou por ser presenteado com a leitura de alguns textos.
Liberdade
(Poema de Isabel Brito Fonseca)
Um dia o poeta deslizou pela fria e tensa estrutura
de caneta de escrever poemas
Confundiu-se com a sua tinta fluida e escorreu pela
vazia e branca folha de papel
Preenchendo-a com uma imensidão de absurdos
e desassossegados pensamentos.
Deambulou pelo oco e concreto objecto de papel,
Deixando nele abstractos e íntimos traços
que formavam palavras,
Palavras que se uniam umas às outras e formavam
os seus coerentes sentidos.
O poeta pôs no papel a fertilidade e infinidade
da magnífica imaginação,
Criou mundos intermináveis de ridículas e fantásticas
possibilidades,
Inventou histórias absolutamente terríveis
e extraordinárias.
Pôs tudo o que loucamente sonhou em causa,
Com raiva e desespero, inundou de tinta preta
até à escuridão total todos os espaços brancos
da usada folha de papel
Exausto, eclipsou-se freneticamente no éter
e finalmente descansou
Abriu descuidadamente ao mundo o coração em sangue,
Voltou a ser menino como outrora,
E descobriu inesperadamente a tão vasta liberdade.