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Morreu em casa e só deram pelo corpo semanas depois

Morreu em casa e só deram pelo corpo semanas depois

José Rendeiro foi encontrado morto na cama. Vivia sozinho no Bairro Azul, na Póvoa de Santa Iria, e foi um vizinho que estranhou a ausência. É mais um caso dramático de solidão.

José Rendeiro, 60 anos, foi encontrado morto na casa onde residia no Bairro Azul da CHEPSI (Cooperativa de Habitação Económica da Póvoa de Santa Iria), concelho de Vila Franca de Xira. Foi no dia 23 de Fevereiro e, pelo estado de decomposição do cadáver, as autoridades presumem que tivesse falecido há várias semanas.
É mais um caso triste que alguns dos moradores temem que se possa repetir no bairro. Muitas pessoas vivem sozinhas, sem familiares com quem contar para pedir ajuda. Em caso de acidente ou doença súbita, só o passar dos dias pode fazer soar as campainhas de alarme entre os habitantes do bairro para a falta do vizinho.
Neste caso, foi um vizinho que decidiu ligar à filha e à sobrinha do falecido a perguntar por ele. As duas eram as únicas visitas de José Rendeiro. Paulo Rodrigues era amigo de José Rendeiro. O morador de 51 anos lembra as queixas que o falecido fazia por estar sozinho. “Muitas vezes negava-se a voltar para casa pois sentia que era somente um quarto com quatro paredes”, afirma Paulo, que viu o corpo de Rendeiro estendido sem vida na cama.
Gilberto Bandjai morava por cima do falecido. Lembra que este estava sempre na rua, mas que a última vez parecia adoentado. Gilberto tem 52 anos mas apesar da idade ainda não deixar que o tomem como idoso, necessita de acompanhamento médico pois padece de esquizofrenia. O sobrinho, Gilson Barbosa, sobe, sempre que pode, até ao alto da Póvoa para visitar o tio. Faz-lhe comida, dá-lhe companhia e encarrega-se de que Gilberto tome os medicamentos.
“Este cenário não é singular, são vários casos neste bairro. Os filhos emigraram e as pessoas ficaram aqui sozinhas. As nossas vizinhas da frente já são idosas, são frágeis e estão aqui sozinhas. Há aqui um outro senhor de 80 anos que vive completamente só, sempre enfiado em casa, sem ninguém com quem partilhar. Se lhe acontecer alguma coisa quem é que o vai ajudar?”, interroga-se Gilson, de 32 anos.
Pedro Pereira mora no bairro há 15 anos. Um acidente de viação confinou-o a uma cadeira de rodas. Diz ter a felicidade de não morar sozinho, mas o mesmo não acontece ao seu vizinho, que pela idade ou problemas psicológicos “esquece-se do gás ligado e deita-se com a frigideira e tachos ao lume”.

Município diz que conhece realidade
A Câmara de Vila Franca de Xira tem conhecimento desta realidade mas não consegue dar uma resposta a 100%. “Nós desenvolvemos o trabalho através das técnicas do centro comunitário, no âmbito do acompanhamento integrado, do qual fazem parte também outras instituições da rede social, como os Companheiros da Noite. Fazem um apoio social e alimentar. Costumam visitar o bairro uma ou duas vezes por semana. Quando as pessoas chegam a situações em que não conseguem viver sozinhas tentamos, junto da Segurança Social, desenvolver diligências para as institucionalizar”, explica a vereadora Maria de Fátima Antunes (PS).
Contudo o morador Pedro Pereira diz que a ajuda disponibilizada não chega. “Os Companheiros da Noite passam por cá duas vezes ao ano. A assistência social dá um apoio alimentar, que se baseia num pacote de leite, arroz e farinha láctea. Para um casal essa ajuda não chega”, critica acrescentando que antigamente o bairro não estava tão abandonado.
O presidente da Delegação da Ordem dos Advogados de VFX, Alfredo Pereira, defendeu no discurso de tomada de posse, que aconteceu recentemente, que se faça uma sinalização de idosos em risco da mesma forma como acontece com os jovens na CPCJ.

Morreu em casa e só deram pelo corpo semanas depois

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